Lei aprovada em 29 de abril autoriza SUDAM, SUDENE e SUDECO a financiaram atividades criativas e intelectuais.

Aprovada pelo Congresso e sancionada com vetos pontuais, a Lei 15.130 autoriza, a partir de janeiro de 2026, que os recursos dos fundos constitucionais possam financiar atividades produtivas ligadas à economia criativa. A abrangência da norma inclui pessoas físicas e jurídicas — como artistas independentes, cooperativas, microempreendedores e empresas culturais — desde que apresentem projetos viáveis do ponto de vista técnico e financeiro. A exigência central é que os empreendimentos se fundamentem na criação de valor por meio da propriedade intelectual e tenham capacidade de gerar emprego e renda. Essa mudança normativa tem implicações relevantes para a descentralização do desenvolvimento econômico e a valorização da cultura e da inovação como vetores de inclusão produtiva
A lei contempla um amplo espectro de áreas, como artes visuais e performáticas, design, moda, software, jogos digitais, turismo cultural, mídia digital, rádio, televisão e serviços editoriais. A retirada de exigências excessivas pelo veto presidencial — como a obrigatoriedade de um projeto executivo prévio com cronograma e a inscrição como MEI ou associação — foi uma medida importante para ampliar o acesso de pequenos agentes culturais ao crédito.
Com a promulgação da Lei, a partir de janeiro de 2026, as superintendências de desenvolvimento regional — SUDENE (Nordeste), SUDECO (Centro-Oeste) e SUDAM (Norte), poderão articular o financiamento de cadeias produtivas criativas, reconhecendo as singularidades culturais e produtivas de seus territórios e fazer uso de crédito preferencial para alavancar a economia criativa destas regiões. Os negócios criativos terão as mesmas condições preferenciais de crédito atualmente oferecidas a pequenos produtores rurais. confira na tabela estas condições:
CONDIÇÕES PREFERENCIAIS DE CRÉDITO – PEQUENOS PRODUTORES RURAIS

Nos seus respectivos Planos Regionais de Desenvolvimento (PRDNE, PRDCO e PRDA), há diretrizes que convergem com os propósitos da nova legislação, como a valorização da bioeconomia, da inovação territorial, da diversidade cultural e da inclusão de grupos sub-representados. A economia criativa, nesse contexto, surge como vetor transversal de desenvolvimento sustentável, ao mesmo tempo simbólico, econômico e social.
Por que financiar a Economia Criativa no Brasil?
A economia criativa brasileira demonstra performance sólida, mesmo em contextos adversos. Em 2020, o setor movimentou R$ 230,14 bilhões, representando 3,11% do Produto Interno Bruto (PIB) do país — superando setores tradicionais como a indústria automobilística (2,1%). Trata-se de uma trajetória de crescimento contínuo: em 2012, a participação da economia criativa no PIB era de 2,72%, mostrando resiliência e potencial competitivo.
No mercado de trabalho, o impacto é igualmente relevante. Em 2023, havia 7,4 milhões de trabalhadores na economia criativa (7% da força de trabalho nacional). No segundo trimestre de 2024, esse número subiu para 8,2 milhões (8% dos ocupados). O crescimento da oferta de emprego nesse setor foi de 4% em 2023, o dobro da taxa registrada na economia como um todo. Os profissionais criativos também recebem remuneração média superior: R$ 4.500 contra R$ 3.000 da média nacional.
Destaques do setor criativo no Brasil:
- PIB criativo de R$ 230 bilhões, equivalente a 3,11% do total nacional.
- 8,2 milhões de trabalhadores em 2024, com crescimento superior ao restante da economia.
- Salário médio 50% superior à média nacional (R$ 4.500 x R$ 3.000).
Mais ainda que mercado, a produção criativa é a principal forma de diferenciação dos produtos nacionais. Seja por uma inovação tecnológica ou por uma criação cultural, é a economia criativa que diferencia os produtos brasileiros de maior valor agregado e que pode criar uma alternativa à economia baseada em commodities. A cultura em si é um produto de alto valor agregado e que contribue para a projeção do país e de seu soft power. Sendo a cultura brasileiro um verdadeiro universo que atrai a curiosidade de todo o mundo, é razoável pressupor o alto potencial de retorno a este estímulo.
A distribuição da economia criativa no território brasileiro revela desigualdades acentuadas, mas também vocações regionais específicas que podem ser potencializadas pela nova política de crédito.
Panorama Regional: desigualdades e vocações
Sudeste
Concentra 50,9% dos empregos criativos. São Paulo e Rio de Janeiro lideram em participação no PIB criativo (4,41% e 4,62%, respectivamente). O Espírito Santo apresentou crescimento de 10,8% em empregos criativos entre 2023 e 2024. Há mais de 56 mil empresas criativas na região.
Sul
Com 31.643 empresas, a região Sul tem desempenho acima da média. Porto Alegre conta com 125,6 mil empregos criativos. Santa Catarina é destaque com 2,96% do PIB estadual em economia criativa. RS e PR seguem com 1,9% e 1,6%, respectivamente.
Centro-Oeste
Com 9.438 empresas, o Centro-Oeste se destaca no DF, que lidera em remuneração em segmentos como arquitetura (R$ 11.873) e publicidade (R$ 7.605). A participação da economia criativa na ocupação regional é de 9,7%.
Nordeste
A região tem 16.880 empresas criativas. Paraíba (13,6%) e Bahia (12,2%) têm altos índices de trabalhadores culturais. O Ceará registrou aumento de 0,79 p.p. na participação criativa. Setores como moda afro, audiovisual, gastronomia e música popular se destacam.
Norte
Menor participação relativa: 2.939 empresas. O Acre tem apenas 5% de trabalhadores criativos. Por outro lado, há imenso potencial em cultura indígena, arte amazônica, turismo comunitário e mídias populares.
Sugestões à operacionalização da Lei 15.130/2025
Agora as determinações da Lei 15.130 deverão ser articuladas e coordenadas para serem integradas aos Planos Regionais de Desenvolvimento (PRDs), aos Arranjos Produtivos Locais (APLs) e às políticas de inovação e cultura já existentes. Para efetivar as linhas de financiamento será ainda necessário uma resolução conjunta dos Conselhos Deliberativos Regionais (CONDELs), que ainda não atualizaram suas normativas para 2026. Portanto, ainda há espaço para proposições.
A primeira delas é a inserção da economia criativa como parte das estratégias de diversificação econômica, redução das desigualdades e sustentabilidade dos Planos Regionais de Desenvolvimento, definindo seus eixos estruturantes em cada unidade federativa. A segunda é a adoção de instrumentos de garantia solidária, pois sabemos da fragilidade financeira da maioria dos negócios culturais nas localidades e nos grupos sociais priorizados pela política. E, para formar o tripé, a gestão dos projetos deve ser adapta com apoio técnico para a elaboração dos projetos no início e adequação dos critérios de monitoramento ao setor criativo. A avaliação dos financiamentos deve ir além dos critérios econômicos tradicionais e incluir:
- Geração de propriedade intelectual (registros, patentes, marcas, direitos autorais).
- Ocupações formais e informais geradas.
- Inclusão de mulheres, jovens, povos originários e comunidades periféricas.
- Territorialização dos impactos (municípios beneficiados, interiorização dos recursos).
Os bancos regionais e cooperativas de crédito locais precisam de capacitação específica para avaliar projetos criativos, cujos ativos são muitas vezes intangíveis ou simbólicos. Parcerias com universidades, SEBRAE, SESC/SENAC, incubadoras culturais e redes de criadores podem fortalecer a qualidade da análise e o apoio pós-financiamento.
Além disso, poderiam ser promovidas oficinas de finanças aplicadas ao setor, com simulações de ROI criativo, análise de valor de marca, audiência digital e potencial de exportação cultural.
As projeções indicam que a economia criativa brasileira poderá gerar 1 milhão de novos empregos até 2030, ampliando o número de trabalhadores para 8,4 milhões. Esta expansão não pode se concentrar unicamente no Sul e Sudeste. A verdadeira oportunidade está na descentralização qualificada da inovação cultural e simbólica, com base na ativação de redes criativas locais em territórios hoje invisibilizados pelos fluxos financeiros tradicionais.
A Lei 15.130/2025, ao incorporar a economia criativa aos instrumentos da Política Nacional de Desenvolvimento Regional, oferece uma ferramenta concreta para transformar desigualdade em diversidade produtiva. Mas seu êxito dependerá da capacidade do Estado brasileiro de articular planejamento, crédito, formação e escuta ativa, com foco nas pessoas que criam e seus territórios.